quarta-feira, 1 de julho de 2009

Ter ou não ter (diploma), eis a questão


Não, o diploma dos jornalistas não acabou. A decisão do Supremo, nessa quarta (17 de junho), limitou-se a dizer que o Decreto Lei 972/69 era incompatível com a Constituição democrática de 1988. Mais nada. E merece elogios - por pretender, esse Monstrengo da Redentora, exercer o controle do jornalismo a partir do Estado. Era nele que estava, em regra acessória (art. 4º,V), a exigência de diploma para registro dos jornalistas no Ministério do Trabalho. Ocorre que, tecnicamente, jamais poderia o Supremo declarar sem valor o DL 972, e deixar vigindo uma de suas regras. Sem juízo de valor, no julgamento, sobre dito diploma - que poderá voltar a ser exigido, em outra Lei. Apenas isso. O mais são palavras ao vento. Inclusive as do eminente Presidente Gilmar Mendes; que, mais uma vez, expressa opinião pessoal sobre tema que pode vir a ser discutido no Supremo - em vez da reserva que, como regra, conviriam guardar seus ministros em situações assim.

Isto posto, cabe então perguntar se afinal esse diploma é bom ou ruim, para a cidadania. Não há consenso; divididos, os países, em três posições. Primeiro grupo, o dos que exigem diploma - Bélgica, África do Sul, Arábia Saudita e mais 11 pequenos. Segundo grupo, o dos que não aceitam nenhum tipo de limitação ao exercício da profissão - Chile, Áustria e Suíça, na linha de “um modelo de desregulamentação” absoluto, como defendido pelo Presidente Gilmar Mendes. Duas visões francamente minoritárias, pois. Havendo ainda um Terceiro grupo, bem mais amplo, dos países que admitem algum tipo de exigência prévia para o exercício da profissão, segundo padrões culturais não uniformes: idade mínima, escolaridade, ausência de condenação penal, algum curso médio ou superior, curso preparatório específico, estágios compulsórios -18 meses (Alemanha e Itália), ou 2 a 5 anos (Espanha).

Esse panorama considera só a base legal; posto que um diploma, no mundo real, significa maiores chances de obter emprego e/ou salário melhor. Na Alemanha, por exemplo, quase nenhum jornal importante contrata quem não tenha diploma. Nos Estados Unidos, onde ele também não é exigido, há 400 faculdades, 120 cursos de pós-graduação e 35 doutorados; sem contar que, na média, 80% das redações é composta por diplomados. Maior diferença, entre redações brasileiras e estrangeiras, é precisamente a quantidade de jornalistas com cabelos brancos; abundantes, nas democracias consolidadas; e escassos, no Brasil, pelo uso indiscriminado de estagiários, lúmpens na profissão, mão-de-obra jovem e barata.

Mas por que jornais, em regra, tanto querem jornalistas diplomados? A resposta é simples. Por ser dispendioso ensinar, dentro das redações, a fazer um jornal. E também porque jornalistas aprendem, nas universidades, que errar custa caro. Nos Estados Unidos, com vitória dos demandantes em 75% dos casos, a média das indenizações oscila ente 100 e 200 mil dólares. Com freqüência, vai muito além disso: Leonard Ross x New York Times, 7,5; Richard Sprague x Philadelfia Inquirer, 34; Victor Feazel x Dallas Television Station, 58; Wall Street Journal x Money Management Analytical Research, 222.7 milhões de dólares. Dando-se então que jornalistas formados, por estatisticamente errar menos, valem mais. E ganham bem mais também, claro. Desde que haja Leis de Imprensa decentes, faltou dizer - o que nunca tivemos, e continuamos sem ter.

Posta a questão em tons técnicos, e mais serenos, o que se vê hoje em nosso país é um cenário anormal. Exótico. Porque, em toda parte, são os próprios jornalistas que não aceitam a exigência do diploma - enquanto, aqui, sua defesa é feita pela Fenaj. E empresas pedem sempre diplomas - enquanto, aqui, as restrições contra ele partem de um de nossos mais respeitados jornais, a Folha de São Paulo. Coisas do Brasil. Dando os trâmites por findos, assim, cumpre agora só esperar por legislação específica do Congresso Nacional - a quem cabe com mais propriedade, e mais legitimidade, de estabelecer requisitos para o exercício das profissões. A ele cumprindo, afinal, decidir se o diploma deve ser mesmo exigido. Ou não.

José Paulo Cavalcanti Filho

Fonte: Folha de PE

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